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De alguma forma, o ar que respiramos está repleto de espectros. 

Gosto de pensar que o último suspiro das pessoas se funde ao ar e passa a ser parte dele, para sempre. 

Indo e vindo pela miríade de pulmões.  

Sentimos o cheiro da decomposição, ouvimos as moscas, 

Respiramos fundo pra tentar preencher vazios que nunca mais serão

Preenchidos, 

O estômago ronca.

Imaginamos sombras dançando no canto dos olhos. 

Clamamos pelo silêncio no crepitar da vela. 

Respiramos fundo e prendemos pra tentar guardar os últimos suspiros.

Sabendo que cedo ou tarde iremos ceder.

 

*

 

Aos cinco anos a curiosidade me afligia

O alfinete me mostrou a dor, o sangue me mostrou a vida. 

Já sabia que não seria possível respirar fundo dentro d'água

Renasci ao ser removido da parte funda da piscina.

 

*

 

A escola era o inferno. 

Carente, careca e introspectivo. Um alvo fácil. 

Foi preciso muito tempo pra que eu pudesse levantar sem provocar ou imaginar risos por todos os lados. 

Não conseguia falar exceto por dentro. 

Reverberando por todos os cantos de meu corpo, imaginando saídas.

Aprendi a sonhar à força.

 

*

 

Aos cinco os alfinetes passaram a ser diários, 

Na verdade eram borboletas, 

Inseridas em meus braços. 

De dentro pra fora elas expulsavam tudo

Que já nasce morto, 

Liso e branco como uma folha da papel,

Precisei do veneno pra sobreviver.

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